O webinário “Gestão de Unidades, Redes Organizacionais e Design Organizacional”, ocorrido na terça-feira (5/10), apresentou o resultado dos trabalhos desempenhados ao longo de um ano pelo Grupo de Estudo, Pesquisa e Inovação (GEPDI 2) do mestrado da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam).
O evento ofereceu proposições para um novo design organizacional do Poder Judiciário, de suas varas e tribunais
O webinário “Gestão de Unidades, Redes Organizacionais e Design Organizacional”, ocorrido na terça-feira (5/10), apresentou o resultado dos trabalhos desempenhados ao longo de um ano pelo Grupo de Estudo, Pesquisa e Inovação (GEPDI 2) do mestrado da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam).
O evento, transmitido pelo canal da escola no YouTube, teve a coordenação dos juízes federais Antônio César Bochenek, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), e Carlos Henrique Borlido Haddad, do TRF1, e da juíza de Direito Elayne da Silva Ramos Cantuária, do Tribunal de Justiça do Amapá (TJAP).
O grupo objetiva oferecer proposições críticas para um novo design organizacional do Poder Judiciário, de suas varas e tribunais, superando sua concepção tradicional voltada para o desenvolvimento de procedimentos meramente cartorários. Ao abrir o evento, o juiz federal Antônio César Bochenek destacou que se tratava de uma apresentação pública de trabalhos dos grupos de pesquisa da Enfam.
“É uma exposição para toda a comunidade jurídica, Enfam, e, principalmente, para os magistrados estaduais e federais. São os trabalhos realizados pelos alunos do mestrado da Enfam e pesquisadores, que, com certeza, têm muito a contribuir para o aperfeiçoamento da jurisdição e para a prestação do serviço jurisdicional”, afirmou o magistrado.
A juíza Elayne da Silva Ramos Cantuária também saudou os participantes, enfatizando que “a Escola vive uma fase nova do mestrado, que é a apresentação do produto e das pesquisas nos diversos temas que são matérias e disciplinas do mestrado”.
Aplicações do Legal Design na atividade jurisdicional
O primeiro tema teve o juiz federal do TRF5 Leonardo Resende Martins como expositor, que apresentou as conclusões de sua pesquisa sobre o assunto. O resultado ainda é parcial, já que os estudos estão em curso e tendem a durar até o primeiro semestre de 2022. O Legal Design se refere à aplicação do design no campo dos serviços jurídicos, com o objetivo de resolver problemas de forma inovadora e com foco na melhoria da experiência dos usuários. Nesse contexto, a metodologia do design poderia, por exemplo, contribuir para a remodelagem de sistemas de tratamento de conflitos ou para a solução de casos judiciais complexos.
A pesquisa teve como foco o mapeamento de práticas judiciais que utilizam metodologias e ferramentas relacionadas ao denominado Legal Design. O estudo utilizou metodologia exploratória, capturando experiências, inovações e práticas criativas já aplicadas por juízes, e avaliou os usos, os objetivos e os resultados já alcançados. O juiz Leonardo Resende Martins ainda passou pelos conceitos de Visual Law, uma subárea do Legal Design, que se situa no plano de comunicação jurídica, utilizado para tornar as informações mais claras, com o uso de elementos visuais em decisões, termos de audiência e outros atos judiciais.
Com intuito de realizar o mapeamento sobre a utilização das ferramentas do Legal Design, o magistrado produziu um formulário cujas perguntas apontaram que os magistrados com mais de 20 anos de carreira são os que mais utilizam as novas ferramentas. “Juízes mais antigos, talvez por uma questão de segurança, têm utilizado tais ferramentas com mais frequência”, apontou o magistrado. Seguindo outros dados da pesquisa, ficou evidente, segundo Leonardo Resende Martins, que os juízes têm uma predisposição a utilizar os instrumentos, desde que tenham a expertise e que o processo eletrônico utilizado em seu tribunal colabore.
Cooperação judiciária: diagnóstico nacional
A partir do segundo painel, os trabalhos passaram a ser conduzidos pelo juiz federal Carlos Henrique Borlido Haddad, do TRF1, que, antes de chamar o próximo pesquisador, parabenizou a discente da primeira exposição e enfatizou “que o objetivo das apresentações é que a plateia apresente críticas, sugestões e responda aos questionamentos da pesquisa, pois o intento é publicar esses trabalhos e que eles estejam maduros para que produzam um impacto efetivo”. A exposição sobre o tema coube ao juiz do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) Francisco Eduardo Fontenele Batista, que também apresentou os dados de sua pesquisa.
O levantamento de informações acerca do assunto permitiu um diagnóstico da cooperação judiciária brasileira nas justiças Estadual, do Trabalho e Federal. A pesquisa explorou a relação intersubjetiva dos juízos, que se dá nas atuações coordenadas, cujo objeto imediato é a gestão processual e o julgamento célere dos processos.
A pesquisa foi norteada pela seguinte indagação: “Qual é o estágio da prática de atos de colaboração entre os órgãos judiciais de 1º grau nas justiças Estadual, Federal e Trabalhista”? O estudo teve como foco a prática de atos de cooperação em processos não penais, então restrita à jurisdição civil. “Com o levantamento realizado, comprovamos que não são tímidas as práticas que consolidam atos de colaboração judiciária. Também não são inexistentes as práticas de colaboração que envolvam atos decisórios”, afirmou o magistrado. Apesar do resultado, o estudo confirma, ainda, que a democratização da cooperação judiciária demanda maior atuação do Poder Judiciário.
Gestão qualitativa das medidas socioeducativas
O juiz do TJ de Pernambuco Rafael Souza Cardozo apresentou os dados sobre a pesquisa do tema “Gestão qualitativa das medidas socioeducativas”, no sentido de conferir maior efetividade e eficiência às medidas que são aplicadas aos adolescentes em conflito com a lei. O magistrado destacou que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) não traz, de maneira clara, critérios que auxiliem os juízes na definição de medidas socioeducativas. Segundo ele, a falta de clareza e sistematização tem gerado disparidades e adoção de critérios distintos para uma mesma situação fática.
“Um dos grandes desafios que se apresentam ao magistrado na seara infracional é a definição de medida socioeducativa, de forma a ajustar o nível de intervenção à real necessidade do adolescente em conflito com a lei, sob a perspectiva socioeducativa, e não punitiva”, disse Rafael Souza Cardozo.
O discente explanou sobre o pensamento de diversos estudiosos na área de psicopatologia do desenvolvimento, que identificam quais são os fatores de risco capazes de contribuir para o envolvimento de adolescentes na prática infracional, e concluiu: “Há discricionaridade dos juízes e disparidades de tratamento tanto na forma como no rigor das medidas socioeducativas, preponderância de critérios com foco no ato infracional e não nos riscos e necessidades do adolescente, e, ainda, uma subvalorização de fatores que têm potencial para evitar a reincidência”, disse o magistrado.
O serviço judicial virtual na visão dos juízes: uma análise qualitativa
O juiz Rodrigo Maia da Fonte, do TRF5, foi quem apresentou os resultados apurados sobre o quarto tema: “O serviço judicial virtual na visão dos juízes: uma análise qualitativa”. A apresentação partiu de um contexto anterior à pandemia, quando quase a totalidade dos processos eram distribuídos de forma eletrônica e o serviço presencial era a regra. Com o cenário pandêmico, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou a suspensão do serviço presencial, e o trabalho remoto foi instituído com uma série de ações englobadas no Programa Justiça 4.0.
Com base nos resultados de outro estudo intitulado “A resposta judiciária à pandemia da Covid-19 – países lusófonos”, do qual participaram mais de 400 magistrados brasileiros, ficou comprovado que mais de 90% dos juízes consideram a prestação jurisdicional satisfatória durante a pandemia. Como já havia a pesquisa quantitativa, o trabalho focou no viés qualitativo.
“Quase a totalidade dos magistrados ouvidos disseram que há a possibilidade de subtração dos espaços físicos das suas unidades e que todos poderiam prestar os serviços de forma virtual. O entendimento dos juízes, com algumas ressalvas, aponta para manutenção dos serviços como estão sendo desenvolvidos hoje, com audiências telepresenciais, teleperícias, atendimento das partes também virtual e com teletrabalho, de forma expandida, tanto para os magistrados quanto para os servidores”, demonstrou o juiz Rodrigo Maia da Fonte.
O direito à desconexão no teletrabalho: estudo de caso no Poder Judiciário Estadual da Paraíba
O direito à desconexão no teletrabalho é um tema altamente pertinente na conjuntura atual. A juíza do TJ da Paraíba Audrey Kramy Araruna trouxe o estudo de caso no Poder Judiciário daquele estado para a apresentação. O tema ganhou força, por óbvio, no contexto da pandemia, quando magistrados e servidores passaram ao teletrabalho por imposição dos riscos de contágio pelo novo coronavírus.
Conceituando o tema, a discente grifou: “É direito do trabalhador usufruir de seus momentos de folga, sem permanecer à disposição de seu empregador, desconectando-se totalmente de seu labor para o fim de se revigorar física e mentalmente”.
Audrey Kramy Araruna destacou que o setor público não tem tanta prática com teletrabalho, ao contrário do que acontece com a iniciativa privada, que desde 1943 já tratava do trabalho a distância. No Judiciário, a questão é recente. Segundo a magistrada, a primeira resolução em relação ao tema foi a de número 227 do CNJ, de 2016, que previu a possibilidade de teletrabalho para servidores mediante o cumprimento de metas de desempenho. O normativo sofreu alterações, inclusive com a Resolução CNJ n. 375/2021, que determinou trabalho remoto no contexto da pandemia. Em relação aos magistrados, há um processo em tramitação no CNJ, ainda sem definição.
Baseada nas informações levantadas até o momento, a pesquisadora apresentou as seguintes considerações preliminares: o teletrabalho é desejado dentro do Poder Judiciário, no recorte espacial do Tribunal de Justiça da Paraíba; a comunicação e o desenvolvimento desse tipo de trabalho precisam de ajustes; e é necessário que seja realizado o aperfeiçoamento de gestões e a capacitação sobre o direito à desconexão.
Plataformas extrajudiciais de resolução de conflitos do consumidor e sua correlação com o processo judicial
Por fim, o último tema foi apresentado pelo juiz do TJ Espírito Santo Salomão Akhnaton Zoroastro Spencer, que tratou de “Plataformas extrajudiciais de resolução de conflitos do consumidor e sua correlação com o processo judicial: análise sob a perspectiva dos operadores do sistema de Justiça no Estado do Espírito Santo”.
O estudo objetiva investigar a perspectiva dos operadores do Direito sobre os potenciais, limitações e impactos do uso de plataformas extrajudiciais de resolução de litígios em cotejo com o processo judicial e, ainda, mensurar aspectos como acessibilidade, imparcialidade, rapidez, custo, dentre outros aspectos, sob a ótica subjetiva.
“Abordando as manifestações obtidas nas respostas abertas, alguns campos se mostraram recorrentes, como a falta de resolutividade. Há diversas referências a essa discrepância entre termos respostas, mas sem uma solução satisfatória ao consumidor. Os danos morais como promotores dessa busca do Judiciário que trata da questão sobre a imposição de sanções efetivas como forma de dissuadir as lesões ao consumidor. Também existe uma preocupação com a segurança jurídica”, disse o juiz.
O magistrado afirmou ainda que há diversas manifestações no sentido de avaliar a admissibilidade das repercussões, desde que haja critérios claros e trazidos em lei ou pela jurisprudência consolidada nos tribunais, e também um problema ligado a uma possível captura das plataformas extrajudiciais. Salomão Akhnaton Zoroastro Spencer ressaltou que essas plataformas necessitam de um olhar mais cuidadoso, com vistas a proporcionar ao consumidor uma via alternativa de resolução de seus litígios.
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