Em 2013, cerca de 7 mil crianças do município de São Paulo com idade entre 0 e 5 anos só conseguiram se matricular nas creches públicas por meio de decisões judiciais. Segundo dados do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), a lista de espera por uma vaga nas instituições contabiliza 176 mil crianças. Preocupados […]
Em 2013, cerca de 7 mil crianças do município de São Paulo com idade entre 0 e 5 anos só conseguiram se matricular nas creches públicas por meio de decisões judiciais. Segundo dados do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), a lista de espera por uma vaga nas instituições contabiliza 176 mil crianças. Preocupados com a crescente judicialização da questão, os desembargadores da Seção de Direito Público do TJSP convocaram magistrados, autoridades do Executivo, parlamentares, acadêmicos e lideranças comunitárias para debater a melhor forma de se equacionar o problema do direito à creche, que é assegurado pela Constituição Federal, numa pioneira audiência pública realizada nesta quinta-feira (29/08).
A ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Eliana Calmon, foi uma das palestrantes do evento, realizado no marco do julgamento da Apelação da Ação Educativa Assessoria, Pesquisa e Educação contra o município de São Paulo. A magistrada, que é a diretora-geral da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados – Ministro Sálvio de Figueiredo (Enfam), saudou a iniciativa pioneira do TJSP por tirar o Judiciário do “imobilismo e por aproximá-lo da comunidade”.
“O Judiciário não pode ser apenas um fazedor de processos. Tem de estar próximo da comunidade em que está inserido, pois este é o perfil da Justiça que está escrito com todas as letras na Constituição Federal de 1988”, afirmou. Eliana Calmon lembrou que é função constitucional do Judiciário zelar pelo cumprimento das políticas públicas e que, neste sentido, o ativismo judicial é muito bem-vindo.
Para a ministra, a audiência pública reafirma a possibilidade do Judiciário ser parceiro do Executivo e do Legislativo na busca de soluções adequadas quanto à implementação de políticas públicas. “Temos de trabalhar em conjunto com as demais autoridades para saber como as coisas podem se delinear. Não é possível nós darmos sentenças que sejam inexequíveis. É nossa responsabilidade fazer com que os procedimentos judiciais sejam de absoluta razoabilidade em seu cumprimento. Cada sentença que vai além das forças daquele destinatário é um pouco de desmoralização para o Judiciário”, avaliou.
Por outro lado, a ministra rechaçou a postura de dirigentes públicos que negligenciam as políticas destinadas aos menores alegando que os investimentos vão além da “reserva do possível”. “Ninguém pode desejar o equilíbrio da sociedade se não cuidarmos do nosso futuro, e o nosso futuro são as crianças”, disse. Para a magistrada, os investimentos em creche têm, inclusive, reflexos na questão da violência contra a mulher.
“Já cheguei a dizer que que desejava menos delegacias da mulher e mais creches porque tenho a convicção de que a mulher que pode sair para trabalhar com segurança, em paz, não apanha de homem, pois tem mais independência e tranquilidade para buscar o seu ganha pão”, afirmou.
Eliana Calmon encerrou seu pronunciamento exaltando mais uma vez a iniciativa do TJSP em buscar o diálogo com os diferentes setores da sociedade envolvidos na questão da falta de vagas de creche em São Paulo. “Não podia imaginar, anos atrás, a realização de uma audiência pública como esta. Vejo uma nova disposição na fala dos senhores desembargadores. A sociedade paulista é uma sociedade com todas as condições,, mas também com grandes e graves problemas, portanto precisa sim desse bom ativismo judicial”, afirmou.