Direito Ambiental, Enfrentamento à Criminalidade e Paridade de Gênero são temas do encerramento do fórum em Belém

Próximo fórum acontecerá em 2024, na Argentina

Na manhã desta sexta-feira (1º/12), em Belém (PA), foi encerrado o II Fórum Desafios Atuais para o Poder Judiciário e o Ministério Público. O evento contou com a presença de representantes da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam), da Organização dos Estados Americanos (OEA), de escolas judiciais, ministérios públicos e diversos órgãos do Judiciário brasileiro e de países integrantes da OEA.

Meio Ambiente
O primeiro painel, mediado pelo secretário-geral da Enfam, Cássio André Borges dos Santos, tratou do tema Poder Judiciário e Ministério Público na Tutela do Meio Ambiente. Participaram como painelistas o promotor de Justiça Adriano Marcus Brito de Assis, da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp); o juiz Alexandre Saliba, da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), e o procurador da República Gabriel Dalla Favera de Oliveira, da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR).

Brito de Assis fez um resumo das ideias-força do evento, dando destaque ao desenho das constituições dos países, instituições participantes e dos compromissos a serem cumpridos levando em consideração o acesso ao sistema de justiça e o cenário global, que apontam como soluções as ações macro. Como sonho a ser concretizado, ele citou a criação de uma espécie de Fundo do Meio Ambiente Amazônico destinado a combater e prevenir problemas comuns, como o tráfico de animais, comércio ilegal de madeira, entre outros. “Temos que sonhar alto, pois a Amazônia merece, espero que do sonho trabalhemos para realizar isso. Formaremos um grupo de estudos, com colegas de outras instituições e outros países, para que possamos dar passos mais concretos para a realização desse sonho”, afirmou.

Como solução para o combate aos crimes ambientais, Saliba sugeriu a possibilidade de utilização do que chamou de “soft law”, ou leis menos rígidas. Elas seriam uma espécie de estímulo para que as partes façam o que deveria ser feito. “Gostaria de reiterar com meus colegas da OEA e pedir seu apoio para que possamos reforçar o uso desses artifícios e dar celeridade à resolução dessas ações. O direito ambiental precisa quebrar as barreiras e paradigmas aos quais estamos acostumados”, defendeu ele.

Favera falou da sua experiência na atuação nos biomas amazônico e semiárido, no município de Irecê (BA). Ele citou dados divulgados ontem no relatório da Organização Meteorológica Mundial (OMN), da Organização das Nações Unidas (ONU). “Apesar de não termos esgotado o ano, o relatório já confirma que teremos, em 2023, o ano mais quente da história. Na última década, o mar subiu o dobro e 90 % da população brasileira vai precisar se deslocar em função do nível do mar”, citou.

Como encaminhamento, o procurador sugeriu preservar a atuação do MP, estruturar soluções macro e “tratar de modo mais maduro e profissional da litigância climática, unificar, harmonizar e estruturar o debate capacitando os membros do Judiciário através da promoção de diálogos sobre a situação climática”, finalizou.

Enfrentamento à criminalidade transnacional, novidades e boas práticas
Moderado pelo vice-presidente da Associação Paulista de Magistrados (Apamagis), Walter Barone, o painel contou com a apresentação do presidente do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), Luiz Fernando Tomasi Keppen, que falou sobre o sistema de integridade no Poder Judiciário; do representante da Ajufe Friedmann Wendpap, que discorreu sobre a ameaça do crime organizado à manutenção do Estado Democrático de Direito, e do procurador de Justiça do MP do Peru Edgar Alfredo Rebaza Vargas, que abordou as experiências de cooperação internacional no seu país.

Wendpap explicou os riscos e as ameaças do crime organizado e do terrorismo à democracia e ao Estado de Direito. “Quando falo de democracia, me refiro à formação de decisões coletivas que têm como efeito nuclear a mudança de poder político sem derramamento de sangue, construída para operar a divergência.”

“Instabilidade política, pobreza, falta de acesso aos direitos fundamentais e prejuízos incalculáveis à economia nacional” foram alguns dos exemplos citados por Rebaza Vargas, que ressaltou a importância da cooperação policial internacional no combate à corrupção. “Hoje há a transnacionalização dos crimes, e a cooperação internacional das polícias é o caminho para este combate. Trago aqui a experiência peruana e realmente é um desafio”, explicou ele ao incentivar o trabalho articulado entre as polícias, Ministério Público e autoridades internacionais.

Keppen compartilhou a experiência do seu estado com a criação do Núcleo de Governança Riscos e Complience, no qual são aplicados os princípios e boas práticas de governança buscando desenvolver liderança, estratégia e controle. “Criamos um código de ética e conduta e um canal de denúncia, além da edição da Política de Governança. Também elaboramos uma Carta Anual de Governança com atividades e estruturas de controle; os Encontros do Judiciário Paranaense contra a Corrupção e o Programa de Integridade buscando prevenir, remediar e combater a corrupção”, explicou.

Minorias e Vulneráveis
As juízas Ana Lya Ferraz da Gama, da Ajufe; Manuela Hermes de Lima, da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (Enamat); e Roberta Ferme Sivolella, da Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), com moderação do procurador de Justiça Adjunto Supremo do MP do Peru Marco Huaman Muñoz, palestraram sobre a atuação judicial e ministerial na tutela dos direitos humanos, eliminação do preconceito no sistema de justiça, paridade de gênero e a tutela das minorias e dos vulneráveis.

Ferraz da Gama destacou a importância do Poder Judiciário na implementação da igualdade de gênero, enfatizando o envolvimento da participação da magistratura e da sociedade, bem como a necessidade de uma educação sólida, inclusiva. “É importante que os magistrados saiam dos seus gabinetes e de fato construam uma sociedade, que tenhamos todos um compromisso em prol da Justiça e da cidadania, construindo uma sociedade mais inclusiva através da igualdade de direitos.”

Ferme Sivolella apresentou dados da ONU segundo os quais 50 mil mulheres são assassinadas a cada ano no mundo, representando uma morte a cada dez minutos. Desse total, 58% são praticadas pelo parceiro ou ex-parceiro. “As mulheres são vítimas de discriminação e violência em todas as sociedades humanas, independentemente da cultura, classe social, etnia e orientação sexual, demonstrando ser uma relevante fonte de exclusão social”, disse ela ao explicar que se trata de um fenômeno culturalmente produzido. “A violência de gênero vem sendo reproduzida perversamente através de gerações; precisamos, enquanto sociedade, nos unir para mudar essa realidade.”

Corroborando com a colega, Hermes de Lima traçou um paralelo com a relação trabalhista na qual a pessoa trabalhadora é a parte mais vulnerável. “Normalmente são pessoas consideradas como grupos minoritários. É necessário haver um equilíbrio entre a relação capital e trabalho e devemos começar com o acolhimento de pessoas em maior situação de vulnerabilidade, estagiários e estagiárias, terceirizadas e terceirizados que geralmente são pessoas negras”, disse ela, apresentando a presença paritária de mulheres nos espaços de decisão como uma alternativa de mudança.

Encaminhamentos
Valter Shuenquener, representante da Organização dos Estados Americanos (OEA), encerrou o fórum com o anúncio do próximo, que deve acontecer em 2024. Ele reafirmou o compromisso firmado no evento: “Tudo que foi debatido será levado para a OEA e pode ser transformado em medidas. Uma carta do II Fórum de Belém do Pará com a síntese das ideias, valores e princípios de tudo que foi discutido aqui está sendo redigida”, finalizou.

[1º/12/2023] Belém/PA - II Fórum Desafios Atuais para o Poder Judiciário e o Ministério Público_Dia 3