Um novo indicador desenvolvido pelo Centro de Pesquisa Jurídica Aplicada da Fundação Getúlio Vargas revela que a ampla maioria da população brasileira não leva muita fé no rigor das leis nacionais. O Índice de Percepção do Cumprimento da Lei (IPCL), divulgado nesta terça (23/4) na Faculdade de Direto da FGV de São Paulo aponta 82% […]
Um novo indicador desenvolvido pelo Centro de Pesquisa Jurídica Aplicada da Fundação Getúlio Vargas revela que a ampla maioria da população brasileira não leva muita fé no rigor das leis nacionais. O Índice de Percepção do Cumprimento da Lei (IPCL), divulgado nesta terça (23/4) na Faculdade de Direto da FGV de São Paulo aponta 82% dos brasileiros considerando ser fácil burlar a legislação.
A ministra Eliana Calmon, diretora-geral da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados Ministro Sálvio de Figueiredo (Enfam), lamentou o resultado da pesquisa e credita a percepção negativa à cultura de impunidade no Brasil. “As pessoas acham que é fácil burlar a lei porque são fartos os exemplos de pessoas que cometem ilícitos e não são punidas. Isso cria essa sensação coletiva de que tem lei que não pega e de que existem figuras imunes à Justiça”, disse.
O levantamento foi feito no quarto trimestre de 2012 e no primeiro trimestre de 2013 em sete estados (São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Bahia, Pernambuco e Amazonas) e no Distrito Federal. A coordenadora do estudo, professora Luciana Gross Cunha avaliou que “esses dados parecem indicar que a obediência às leis no Brasil ainda exige uma justificativa”.
O estudo também revelou que o descumprimento das normas é maior dentre a população de maior renda, mais de 12 salários mínimos, e com maior escolaridade. Para a ministra, é sintomático que a parcela mais escolarizada e de maior renda seja justamente a que mais acredita na fragilidade das leis.
“As pessoas melhor informadas conhecem as deficiências do sistema e não acreditam que as leis tenham efetividade, sobretudo para aqueles que podem pagar advogados de renome. O problema é que muitos se inspiram nesses exemplos perniciosos e também passam a ter uma conduta de desprezo pela legislação. Insisto: essa cultura terrível só vai cessar quando as pessoas perceberem que existe Justiça e que a impunidade não é mais uma rotina”, avaliou a ministra.
Eliana Calmon acha importante para os magistrados a pesquisa cujos resultados devem ser analisados por todo o Poder Judiciário. “Se as pessoas acham que é fácil burlar a lei é porque não levam a Justiça a sério. É uma questão de credibilidade, a sociedade está de olho”. “Estamos trabalhando na Enfam para criar uma magistratura mais preocupada da posição do juiz perante os anseios da população e, por isso mesmo, mais combativa à praga da impunidade”, completou.
Outros indicadores
Analisando-se os resultados da pesquisa, mais surpresas. Por exemplo, em relação ao respeito às autoridades, 81% dos entrevistados acham que as pessoas têm de pagar uma quantia a alguém, mesmo que discorde da decisão, se a ordem partir de um juiz. O percentual cai para 43% se a ordem partir de um policial.
Quanto à expectativa de punição diante de algumas situações, 80% dos entrevistados, entende que levar itens baratos de uma loja sem pagar, “muito provavelmente” acarretará em punição; 79% consideraram que, se dirigirem após consumir bebida alcoólica, serão punidos; 78% afirmaram ser possível sofrer uma punição se estacionarem em local proibido. No entanto, 54% dos entrevistados responderam que é “provável ou muito provável” que da compra de um CD ou DVD pirata leva à punição.
“Tais resultados revelam que há poucos incentivos para cumprir a regra de comprar apenas produtos originais”, avaliou Luciana Gross.
Em 90% das respostas, a situação com maior reprovação social é a de levar itens baratos de uma loja sem pagar, seguida por dirigir depois de consumir bebida alcoólica (88%) e dar dinheiro a um policial ou outro funcionário para não ser multado (87%). Já a situação com menor reprovação social é a compra de produtos piratas (64%).
Quase a totalidade dos entrevistados (99%) consideraram “erradas ou muito erradas” as condutas de dirigir alcoolizado, jogar lixo em local proibido, levar produtos sem pagar e estacionar em local proibido. Já comprar CD ou DVD pirata foi considerada errada ou muito errada por 91% dos entrevistados. Atravessar a rua fora da faixa de pedestre foi apontada como conduta errada ou muito errada por 94% das pessoas.
A íntegra do estudo está disponível na área Texto para Debates no portal da Enfam.
Com informações da FGV/SP.